A história mais triste que eu conheço é a do Dalilo. Ele é um primo distante do meu pai, e assim, meu tio.
Quando eu tinha uns 16 anos, os velhos foram para a praia, e eu trabalhava, fiquei sozinho na casa. Um fim de tarde, surgiu o Dalilo. Um cara quietão, que falava pouco com uma voz que o vocalista do Black Sabbath deveria ter. Ele disse que tinha vindo a pé, de longe, tipo Taquari, uns 70 km, visitar meu pai, dormindo na estrada, se alimentando com uma boia fria que ele trouxe. Tinha trazido um presente, uma garrafa térmica, imaginei o quanto aquilo deve ter custado pro tio. Eu expliquei que o pai estava de férias, mas que ele podia ficar ali. Abri o galpão, que é a nossa segunda cozinha, com banheiro, churrasqueira, área de serviço, um projeto do pré-ex-arquiteto Tuta, ao lado da casa, arrumei um colchão e roupa de cama sobre umas tábuas, deixei a porta fechada, mas destrancada. Ele ficou de voltar mais tarde. No outro dia, eu fui procurar pelo Dalilo, nada. Aí olhei atr as do galpão, havia umas folhas de papelão, uma marmita de alumínio e uma colher. O Dalilo tinha dormido ali, com o céu como teto. Quando ele apareceu, perguntei porque ele não tinha entrado no galpão. Ele, com vergonha, me disse que não sabia como abrir aquela tranca (maçaneta) estranha. A porta do galpão era a antiga porta da frente da casa, que foi reformada, e tinha a maçaneta tipo bola. O Dalilo não sabia que tinha que torcer aquela peça para abrir.
Dalilo, desculpe por não explicar. Mas valeu por aqueles almoços e jantas que fizemos juntos até o dia em que tu se foi. Nunca mais soube de ti, mó pé-de-estrada, a coisa mais próxima do termo globetrotter que eu já vi, bate de longe o Kerouac e o Lauro Fiss.
Por incrível que pareça, o meu pai aos seus 52 anos ainda sonha em ser um andarilho. Abandonar a bicicleta (o que eu acho impossível) e seguir a vida caminhando por onde o tempo o levar.
ResponderExcluirAmo ver o meu pai sendo citado por pessoas do Brasil inteiro. Ele é meu ídolo.