segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

AINDA NÃO LI, VOU LER DEPOIS, MINHA MULHER LEU E ME DISSE QUE É MUITO BOM, ENTÃO VOU LER.


MARCELO FERRONATO
de Valência

Antes de ir dormir ontem de noite, já bem tarde na madrugada daqui, conversei pela internet com um amigo jornalista. É o Guilherme Dorneles, e como eu sabia que ele já tinha tido experiência em uma cobertura pelo Grande Prêmio aqui na Espanha, pedi algumas dicas pra ele. Minha dúvida era basicamente "como funciona o esquema de comida para a mídia na F1?".

O Guilherme me tranquilizou, dizendo que sempre tem algumas coisas pra comer e ainda revelou que tem 'boca livre' onde a Red Bull se instala. "Putz, mas a Red Bull não veio aos treinos", me perseguiu esse pensamento. "Ah, mas a Toro Rosso está aqui, e como é tudo a mesma coisa, vai ter o tal do rango de graça", pensei.

E hoje, depois de tomar um belo café-da-manhã, fui despreocupado para o autódromo de carona com uns alemães que conheci no restaurante da pousada — sim, evoluí, estou numa pousada agora. Valeu muito à pena a carona. Primeiro, porque economizei com o táxi, já que ouvi do recepcionista que eu teria que andar 45 minutos se quisesse ir a pé. Segundo, porque já acertamos carona fixa. Vou e volto com eles a partir de agora. E terceiro, porque a conversa no carro rendeu uma bela matéria sobre o Schumacher.

Chegando no circuito Ricardo Tormo, peguei a credencial com a mocinha que demorou pra achar meu nome entre os dos 315 jornalistas que haviam se inscrito até o momento. E depois seguimos pra sala de imprensa. Fomos uns dos primeiros a chegar, e como a enorme sala estava praticamente vazia, seria fácil notar a existência de alguma mesa com quitutes. Nada. Mas como o café ainda estava no meu estômago, deixei pra pensar nisso depois.

Depois de escrever algumas matérias pequenas, fui tentar desvendar o primeiro mistério do dia. "Quem seria o segundo piloto da Renault? O time vai fazer o lançamento hoje só com um competidor?". A equipe francesa havia confirmado apenas o Kubica, e como a apresentação oficial da escuderia seria logo mais, pensei que alguém poderia me dar alguma dica.

As salas de imprensa dos circuitos ficam geralmente acima das retas de largada, então é preciso descer escadas pra chegar a alguma informação. Mas nesse caso nem foi preciso. Logo que levantei, dei de cara com a assessora da Renault. "O time vai apresentar os dois pilotos hoje?", perguntei. "Sim", respondeu apressada. "E quem é o companheiro do Kubica?". "Não sei", ouvi. Lógico que ela sabia. "Você sabe né, mas não quer falar", eu disse. Ela sorriu, deu uma piscadinha e foi embora.

Pronto, já sabíamos que o lançamento não seria com um piloto só. "Mas e o outro?". O nome mais cotado era o de Vitaly Petrov, que acabou sendo confirmado no final do dia. Mas ninguém tinha certeza ainda. Então desci as escadas.

Ali no meio dos caminhões da Renault, vi um mecânico dando sopa. Cheguei e dei uma de joão-sem-braço pra ver se tirava alguma informação. "Você sabe que horas o Petrov chega aqui no autódromo?". "Deve ser antes das quatro, né? O lançamento está marcado para às quatro e meia", respondeu. "Então é o Petrov mesmo o segundo piloto da equipe?", devolvi. "Não sei, não sei se é o segundo ou o terceiro", falou.

Continuei cavando. "Então ele já foi mesmo contratado pela Renault?". "Não sei. Na verdade, ninguém da direção da equipe me disse nada. Eu estou te dizendo isso somente com base nas minhas opiniões. Pelo que tenho visto ultimamente, deve ser ele". A informação não era oficial, mas já dizia muito.

Voltei pra sala de imprensa para contar a novidade aos colegas do site que estão no Brasil, que atualizavam incessantemente o conteúdo do Grande Premio. E nisso, um deles, o Felipe Paranhos, me avisou que um jornalista inglês havia publicado que viu o Rubinho dando o ar da graça no circuito. "Opa, tenho que achar o cara". E lá vou eu de novo para as escadas.

Perguntei pra um mecânico da Williams onde eu poderia achar o brasileiro. "Logo ali, ó, está almoçando", respondeu. Aí eu me toquei que já era uma da tarde e lembrei que estava com fome. E lembrei que o café que tomei às 8h já tinha desaparecido completamente do meu estômago. "Mas é o Rubinho, eu tenho que falar com ele", pensei, aquietando minha vontade de fazer aquilo que o piloto estava fazendo.

O local onde ele estava era uma área restrita para os membros da Williams, mas fingi que não sabia e entrei. Fui direto na mesa dele, interrompendo seu tranqüilo almoço com os mecânicos do time que ele vai defender nesta temporada. "Rubinho, desculpa te interromper, mas você poderia me dar uma entrevista quando acabar?". "Lógico. Quando eu terminar, te encontro ali na saída", disse muito educadamente.

Fiquei andando de um lado pro outro ali na entrada da tenda onde ele estava, pensando nas perguntas que eu iria fazer e procurando um lugar em que não batia tanto vento, pra não estragar o som no gravador. Ele saiu e me disse para eu segui-lo. "Preciso achar um lugar em que esse vento forte não atrapalhe a gravação", eu falei. "Vamos ali no meu motorhome, então."

"Vamos ali no meu motorhome?", pensei. E aí lembrei que o Rubinho tem um furgão que utiliza quando viaja para as corridas e treinos. Ele acampa nos autódromos dentro desse furgão, que tem tudo o que alguém pode encontrar em um bom quarto de hotel.

Entramos. Ele desligou a TV, e aí começamos a conversar. Falamos sobre as expectativas dele pra temporada, sobre o retorno do Schumacher, sobre a possibilidade de ele continuar na F1 até os 40 anos de idade — ele tem 37 — e muitas outras coisas. Você confere tudo no Grande Premio nesta segunda-feira.

Marcelo Ferronato/Grande Prêmio



O interior do veículo é impressionante. Super confortável. Uma sala pequena com sofás e uma mesa, um quarto, um banheiro, TV, internet e uma cozinha. Sim, quando vi a cozinha, lembrei de novo da minha fome, e vi que já eram mais de duas da tarde. Quando estava me despedindo do Barrichello, perguntei se ele sabia se o Petrov seria contratado pela Renault. "Não sei, mas o carro dele está aí, ó", apontando para um carro com uma placa da Rússia. "Pronto, matei dois coelhos", pensei. Agradeci ao piloto e voltei correndo pra sala de imprensa.

[Grande Prêmio direto de Valência]
► Carro com placa da Rússia entrega presença de Petrov no autódromo

"Gente, tirei foto do carro do Petrov, deve ser ele mesmo na Renault. E acabei de entrevistar o Rubinho", escrevi. Enquanto nossa equipe do site preparava como iríamos publicar isso, fiquei de olho no relógio. Às 14h30, a BMW Sauber iria fazer seu lançamento oficial. "Tenho meia hora pra mandar as fotos pro Brasil, escrever alguns detalhes e almoçar. Dá tempo", pensei. Nada disso. Às 14h26 ainda estava na frente do computador. Fechei tudo e saí correndo para ver a Sauber lançar um carro feio, quase inteiro branco e com quase nenhum patrocínio.

Marcelo Ferronato/Grande Prêmio




Depois das entrevistas coletivas do chefe da equipe Peter Sauber, do diretor-técnico Willy Rampf e dos pilotos Pedro de la Rosa e Kamui Kobayashi, voltei para o computador. Eram quatro da tarde já, e nada de lanchinhos oferecidos pelas equipes ou algo parecido. Nem lembrei de ir conferir as instalações da Toro Rosso. Não tive tempo.

Às 16h30, começava outro lançamento, o da Renault. Impossível atualizar as informações para os companheiros do Brasil e sobrar tempo pra comer. "Você não comeu ainda, caipira?", me perguntou o editor-chefe do site, Victor Martins. "Não deu tempo". Não era culpa dele, nem minha, nem de ninguém. Faz parte, como diria o sábio Kleber Bambam — sim, desenterrei.

Passei tudo para a equipe e me mandei de novo para a pista pra ver o lançamento da Renault. Expectativas confirmadas. Um dos pilotos que tirou o pano que cobria o novo carro do time era Vitaly Petrov. Entre os dois carros apresentados, certamente o da Renault impressionou mais, com uma pintura em amarelo e preto homenageando o primeiro modelo com que a equipe disputou uma corrida de F1, em 1977.

Marcelo Ferronato/Grande Prêmio



Entre a sessão de fotos e a primeira entrevista, havia um pequeno intervalo de 20 minutos. "Nossa, que bom, a Renault pensou em mim, vou poder comer". Passei as fotos rapidinho para o pessoal e me mandei pro restaurante do autódromo. Quando cheguei lá, ofegante, uma senhora saiu do prédio e me disse: "Está fechado."

Nem perguntei mais nada, decepcionado, com raiva e preguiça de saber o porquê. Adianta? Não. Então decidi que iria entrar nas instalações da primeira equipe que eu visse e que pediria algo pra comer.

Dei muita sorte. Entrei numa tenda da BMW Sauber e perguntei pra uma moça se ainda havia almoço. "Almoço? Já são mais de cinco. Mas espera aí que eu faço um lanche pra você". "Fazer um lanche pra mim?". Não acreditei. Segui a moça até a cozinha, agradecendo intensamente pela boa ação que ela acabava de fazer.

Marcelo Ferronato/Grande Prêmio



Voltei pra sala de imprensa correndo, porque já estava em cima da hora da primeira entrevista dos membros da Renault. Deixei meu lanche do lado do computador e me mandei. Depois de ouvir umas mil vezes a palavra "business" de Gerard López, chefe do grupo de investimentos Genii, que assumiu o comando do time, fui para as entrevistas de Kubica e Petrov.

Conversei com os dois pilotos e voltei pra frente do computador. Mesma história: mandei algumas informações pro pessoal, enviei as fotos, e aí já eram sete da noite. Já estava escuro, e os jornalistas começavam a levantar o acampamento. Meus colegas alemães, que me deram carona, me disseram: "Estamos saindo em cinco minutos. Vai querer ir com a gente?"

Despedi-me pela internet dos incansáveis companheiros do site, peguei o sanduíche que havia deixado do lado do meu computador e fui comendo no caminho de volta para a pousada. Aprendi a lição. Amanhã, vou levar um lanchinho na mochila.

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