segunda-feira, 29 de novembro de 2010

JO-ANN-KELLY

Foi assim, eu estava passando na calçada e ouvi aquela voz:
- Vocês não podem me negar uma mesa neste restaurante de merda! Eu sou Jo-Ann-Kelly, a maior voz inglesa do blues! Seus merdas!

E era mesmo. A voz da mulher, parecia ter mil anos a mais do que a sua dona, que estava no fim da vida, ainda com o fogo do pântano explodindo em seu pescoço fino.

- Desculpe, não pude evitar de ouvir, a senhora é Jo-Ann Kelly? A que gravou "Come to my kitchen?" sabe que eu tinha medo de ouvir seus discos, pois eu via umas imagens muito estranhas ao escutar as músicas? Do mesmo modo que ao ouvir o Bob Marley eu vejo a figura de um leão, ao colocar o Miles Davis eu vejo um cão vagando sem dono, com suas músicas eu vejo um homem negro e velho, que abre uma porta numa parede onde não havia nada.

- Olha, como é seu nome?

- Renato.

- Olha, Renato, muitos me falam que enxergam esse homem, em diferentes situações. Não é meu parente, pois eu sou branca e toda a minha família é assim. Quem sabe não é Deus, convidando para jantar em sua cozinha? Sim, porque nós somos os seus servos, não é mesmo?

- Pode ser. Escuta, o que houve no restaurante ali?

- Disseram que não havia reserva com meu nome, eu tenho certeza que fiz. Pedi para a telefonista do Hotel Imperial fazer a ligação para essa baiúca aqui!

- Mas o Hotel Imperial foi demolido há mais de vinte anos! A... cadê ela?

No que olhei para o lado e me virei de volta, a velha senhora tinha desaparecido. Corri até a esquina, não havia ninguém, todas as lojas estavam fechadas, mas eu juro que ouvi o som de uma porta se abrindo. E, a seguir, sendo fechada.

Nenhum comentário:

Postar um comentário